Uma Mãe por esporte

Existem mulheres que geram filhos em seu ventre, outras que optam pela maternidade e adotam “filhos de coração”, avós que se tornam mães, pais que fazem o papel dos dois, enfim, há várias formas de se “maternar”. No universo esportivo não poderia ser diferente.

Quantos técnicos acompanham atletas desde sua infância até a fase adulta, muitas vezes convivendo mais com eles do que sua própria família? Foi assim, através do esporte que Hilda Miriam Guitler, a Pitchi, se tornou uma grande mãezona para muitos meninas e meninos da ginástica artística.

O começo de tudo

Natural da Argentina, Pitchi teve seu primeiro contato com a ginástica artística, ainda quando pequena, praticando na escola onde estudava. Chegou inclusive a disputar algumas pequenas competições representando a instituição. Anos mais tarde, após terminar o colegial, decidiu cursar a faculdade de educação física e mais uma vez se deparou com a modalidade.

“Na educação física, minhas primeiras amigas eram ginastas e com elas eu me aproximei ainda mais. Assistia campeonatos e fiz o meu primeiro curso de árbitra. No segundo ano, além de arbitrar, comecei também a dar aula. Mas como o local onde eu trabalhava era muito longe, acabei ficando só como árbitra e esperei me formar para voltar a ser técnica”.

Um parceiro de vida e profissão

E foi exercendo a função de árbitra que ela conheceu aquele que seria seu parceiro de vida e de profissão, Raimundo Benito Blanco. Durante uma competição onde os dois arbitravam, acabaram tendo uma primeira aproximação através de uma simples oferta de um “cafezinho”.

“É comum fornecerem café aos técnicos durante a competição. Mas desde aquela época, até hoje, eu não tomo café. Então me virei e o árbitro do lado era um tal de Raimundo Blanco, eu ofereci o meu para ele, que aproveitou a ocasião e me convidou para sair, mas eu não aceitei. Só um ano depois ele voltou a me convidar e então começamos a namorar”, relembra Pitchi.

Já no início da década de 80, após ter se formado, começou a trabalhar como técnica em um Clube de Buenos Aires, mas acabou trocando por outra instituição posteriormente para que ela e o namorado começassem a trabalhar juntos.

“Para trabalhar com equipe feminina, geralmente é um casal. E desde esta época começamos a ser técnicos juntos”.

Nova pátria

A argentina conta que o seu companheiro Blanco, que além de técnico ainda atuava como atleta, tendo sido campeão argentino durante seis anos, recebeu um convite para participar de um Campeonato no Brasil representando o Clube Paineiras, isso no ano de 1985.

“O Blanco veio para um campeonato como ginasta e aí ele foi convidado pelo Paineiras, para ficar e representar o Paineiras como atleta e também ser técnico”.

Depois que ele aceitou o convite, Pitchi também decidiu se mudar para o Brasil. Mas ao contrário do marido, que ficou pela capital paulista, o primeiro emprego que conseguiu foi em São José dos Campos.

“Eu ia duas vezes por semana, depois aumentou para quatro. Ia e voltava todas as vezes. Até que depois acabei conseguindo um outro emprego no Clube Sírio”.

A Dupla voltou a atuar junta novamente, após receberem um convite do Clube de Santos, no litoral paulista.

“No primeiro ano ele até ficou no Paineiras e eu viajava para Santos sempre. Já a partir do segundo ano, acabamos nos mudando para lá, onde moramos e trabalhamos por 13 anos. Nós tivemos uma das equipes mais importantes do Brasil. E o Blanco ainda competiu por Santos mais uns 2 ou 3 anos, só parou com uns 33 anos”, relembra a treinadora.

Construindo uma grande família

Após uma temporada de 13 anos em Santos, receberam uma outra proposta e acabaram indo para o Chile, mas a estádia por lá não durou muito tempo.

“Ficamos quase dois anos no Chile e quando estávamos lá recebemos um convite do Esporte Clube Pinheiros para voltar para o Brasil, isso foi em 2002”.

O casal chegou no Pinheiros, que na época tinha a equipe competitiva, mas não contava com a escolinha, que até então funcionava junto com as demais atividades do CAD, destina para crianças a partir dos 7 anos.

Pitchi explica que sentindo a necessidade de atender um público mais amplo, criaram o “Baby Gym”. “A ginástica é um esporte precoce e se trabalha a partir dos 3, 4 anos. E em 2003, nós compramos uma aparelhagem francesa e junto ganhamos aparelhinhos, que eram aparelhos todos adaptados para crianças pequenas. Então nós criamos o Baby Gym”.

Depois de um tempo, os dois departamentos acabaram negociando, com o “Baby Gym” passando a ficar sobre a responsabilidade do CAD e a Ginástica Artística passando a comandar a Escolinha (que antes atendia crianças a partir dos 7 anos e hoje atende a partir dos 10).

“A escolinha é de iniciação, onde eles vão aprender a fazer tudo. Trata-se do conhecimento das partes do corpo, de lateralidade, equilíbrio, flexibilidade, coordenação e de tudo o que se ensina dentro da psicomotricidade. E onde nós ensinamos a pessoa a conhecer o seu corpo e depois como vai desenvolver ele”.

Ela chegou a atuar como técnica da escolinha por muitos anos, mas também atuou com a equipe competitiva, chegando inclusive a fazer parte da comissão no período em que Daiane dos Santos e Laís Souza defendiam as cores do Clube.

Há mais de 30 anos no Brasil e já tendo se naturalizado no país Pitchi brinca que já pe mais brasileira do que argentina. Ela e Blanco não tiveram filhos biológicos, mas com tantos anos dedicados a ginástica e tendo convivido com tantos meninos e meninas ajudando em suas formações como atletas e muitas vezes como pessoas, acredita que construído uma grande família”.

“Eu tenho muitos filhos e filhas. Tem algumas hoje em dia inclusive que já são mães e me mandam fotos das minhas netas. Não temos filhos, não vieram e nós sempre continuamos, porque nossa vida sempre foi muito agitada. Se tivéssemos tido um filho, acho que eu teria carregado ele nas costas para todos os lados e ele ia viver no ginásio com a gente”.

Hoje a “mãezona” trabalha mais com a parte administrativa da modalidade, mas está sempre presente nas competições, acompanhando e cuidando de perto dos atletas, seja dando um conselho, acompanhando numa consulta média ou até mesmo dando um abraço acolhedor.

“Às vezes eu desço e dou aula e me sinto muito bem, eu gosto disso. Quando eles fazem alguma coisa nova eles me chamam para mostrar também, eu continuo participando ativamente da rotina do ginásio. Se fosse para voltar lá atrás eu faria tudo novamente do mesmo jeito, não mudaria nada. A ginástica artística é a minha vida, com certeza”, conclui Pitchi.


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